OUTROS DIAS DA MULHER: Reivindicação de mães moldou perfil das creches em SP desde os anos 20
Com a inserção da mulher no mercado de trabalho nas décadas de 1920 e 1930, as creches foram construídas para serem instituições auxiliares das famílias consideradas pobres e desestruturadas, mas ainda não tinham o conceito atual de um espaço para educação com orientação pedagógica e socialização da criança.
Em 1943, no Estado Novo, o artigo 389 da CLT (Consolidação das Leis de Trabalho) obrigou as empresas a construírem locais adequados para guardar -termo da época- os filhos de suas funcionárias.
Em São Paulo, o perfil das creches começou a ser mudado nos anos 1960. Fruto da articulação de Helena Iraci Junqueira– uma das primeiras vereadoras da cidade e primeira mulher a ocupar uma secretaria na administração da Prefeitura de São Paulo. O plano para a ampliação de creches na cidade foi lançado em 1965, após uma reunião entre o prefeito Faria Lima, entidades religiosas e secretarias de Educação e Cultura.
No encontro, foi tratada a responsabilidade do poder municipal e a cooperação da iniciativa privada. Em reportagem da Folha, Helena Iraci Junqueira disse que mais de 500 mil mulheres trabalhavam na capital e apenas 25 mil crianças, até 13 anos, eram atendidas nos parques infantis, semi-internatos e creches.
Em novembro de 1965, a Prefeitura anunciou as entidades que receberiam assistência: Creche Maria Dulce, na Casa Verde; Obras Assistenciais Nossa Senhora do Ó; Creche Santo Alberto, nas Perdizes, Centro de Assistência Social Brás-Moóca, Creche Catarina Labouré, no Ipiranga, entre outras.
Já em 1967, Faria Lima inaugurou as primeiras creches nos novos moldes. No mesmo ano, a Sebes (Secretaria do Bem Estar Social) divulgou uma lista com nove creches construídas e seis em construção. Bairros como Jabaquara e Santo Amaro, na zona sul, e Vila Formosa, na região leste, entre outros, foram contemplados. Naquela época, as mães precisavam pagar uma mensalidade.
Nas décadas de 1970 e 1980, houve resistência por parte das mulheres que mais precisavam destes espaços. Havia o senso comum de que creches eram como orfanatos, locais para crianças abandonadas e a existência delas seria fruto de reivindicação comunista.
Mesmo assim, a pressão das feministas e das mulheres das periferias paulistanas foi decisiva para a construção de instituições gratuitas. Reportagem da Folha de 1979 registrou a pauta do 1º Congresso da Mulher Paulista: “Creches totalmente financiadas pelo Estado e empresas, próximas aos locais de moradia e trabalho, que não sejam meros depósitos de crianças”. Nos anos 1980, a creche passou a ser um direito de mulheres, homens e principalmente das crianças.
Os jornais feministas “Brasil Mulher” e “Nós Mulheres” colocaram a luta como prioridade. Iniciativas como o Clube das Mães do Jardim Santo Antônio, na periferia, e o Movimento de Luta por Creches (foto no topo) também foram importantes na batalha por direitos das crianças na capital. De olho na movimentação, políticos utilizaram a creche como principal bandeira em suas campanhas.
Em 1984, a cidade de São Paulo passou a ter uma rede com mais de 120 unidades gratuitas. A Constituição de 1988 definiu a creche e a pré-escola como direito da família e dever do Estado.
Passados 29 anos sob a administração de oito prefeitos de diferentes partidos políticos, a demanda por creches continua sendo um problema para grande parcela da população da capital. Recentemente, um levantamento da Folha mostrou que, para zerar o deficit, o atual prefeito João Doria (PSDB) terá que construir ou conveniar mais de duas unidades por dia até o final de 2017.
No dia 2 de janeiro, Doria disse que pretende usar agências bancárias vazias para a criação de creches na cidade de São Paulo.
Nesta sexta (3), no lançamento do programa Nossa Creche, o prefeito de São Paulo prometeu zerar o deficit até 30 março de 2018.