Acervo Folha https://acervofolha.blogfolha.uol.com.br No jornal, na internet e na história Fri, 19 Feb 2021 13:40:24 +0000 pt-BR hourly 1 https://wordpress.org/?v=4.7.2 1968 – AS 28ª E 29ª BOMBAS: Avião da praça 14 Bis e multinacional viram alvos https://acervofolha.blogfolha.uol.com.br/2018/12/17/1968-as-28a-e-29a-bombas-aviao-da-praca-14-bis-e-multinacional-viram-alvos/ https://acervofolha.blogfolha.uol.com.br/2018/12/17/1968-as-28a-e-29a-bombas-aviao-da-praca-14-bis-e-multinacional-viram-alvos/#respond Mon, 17 Dec 2018 09:00:38 +0000 https://acervofolha.blogfolha.uol.com.br/files/2018/12/aviaoC3-320x213.jpg https://acervofolha.blogfolha.uol.com.br/?p=10645 Quatro dias após o então presidente do Brasil, Arthur da Costa e Silva, ter baixado o Ato Institucional nº5 e endurecido o regime ditatorial, duas bombas explodiram na região da Grande São Paulo na madrugada de 17 de dezembro de 1968.

Um dos alvos foi o avião da FAB (Força Aérea Brasileira) que ficava exposto como um monumento na praça 14 Bis, perto da avenida 9 de Julho, na Bela Vista, região central de São Paulo.

O outro ponto de ataque foi  na  seção de classificação de algodão da multinacional americana Anderson, Clayton & Company, em São Caetano do Sul. As duas ações não deixaram feridos.

Essas foram as últimas duas das 28 bombas em 1968 na região metropolitana de São Paulo que foram contabilizadas em um levantamento do Banco de Dados da Folha. As histórias de todos os casos foram relatados no Blog do Acervo em 2018.

Clique na imagem e confira o mapa das bombas em São Paulo em 1968

A bomba na praça 14 Bis não teve grande poder destrutivo. Danificou a fuselagem e a asa direita do avião C-3, que havia sido transformado em um monumento para homenagear os pracinhas da FEB (Força Expedicionária Brasileira).

O veículo aéreo, utilizado em combates na Itália durante a Segunda Guerra, foi adaptado e colocado sobre uma armação de cimento para que pudesse ser visto com maior facilidade. Em sua volta, para isolá-lo, foi colocada uma corrente presa a cápsulas usadas também na guerra. Porém as crianças costumavam entrar na área para brincar.

O autor do atentado, assim como faziam as crianças nas brincadeiras, passou pelas correntes. Deixou o artefato junto ao pedestal do monumento e fugiu.

A explosão não fez com que o avião caísse, mas provocou a quebra de vidros em vários prédios vizinhos. O barulho foi ouvido até da delegacia que funcionava na rua Marques de Paranaguá (a aproximadamente um quilômetro do local).

Os agentes foram à praça e recolheram panfletos com mensagens atribuídas ao ex-deputado Carlos Marighella. Ele lutava contra a ditadura e era líder de um grupo armado que viria a receber o nome de ALN (Ação Libertadora Nacional).

O texto divulgado nos panfletos negava a participação de Marighella em assaltos, mas o ligava aos movimentos contra o regime militar. Também havia a reclamação de que os Estados Unidos tinham se transformado em donos do Brasil.

Em 18 de maio de 1992, a Folha publicou uma reportagem, assinada pelo jornalista Mario Cesar Carvalho, relatando que o arquiteto e artista plástico Sérgio Ferro participou do ataque contra o avião da FAB.

Na época da ditadura, Ferro integrava o “Grupo de Arquitetos”, que tinha ligação com a ALN. Também chegou a fazer a ponte com a VPR (Vanguarda Popular Revolucionária). Ficou preso por um ano, entre dezembro de 1970 e dezembro de 1971, e foi torturado.

Da França, onde radicou-se no exílio, Ferro comentou a ação na praça 14 Bis. “Isso foi ridículo. O avião não caiu, coitado, ficou lá”, declarou.

Na mesma reportagem de 1992, o arquiteto fez uma revelação, bem mais séria. Disse ter colocado, junto com o arquiteto Rodrigo Lefévre (1938-1984) e com uma outra pessoa que ele não contou o nome, a bomba no Consulado dos Estados Unidos na madrugada de 19 de março de 1968.

A explosão atingiu o estudante Orlando Lovecchio Filho, que passava pelo local e teve que amputar o terço inferior de sua perna esquerda.

A reportagem do Banco de Dados Folha não conseguiu entrar em contato com Ferro.

São Caetano do Sul

Assim como ocorreu na praça 14 Bis, panfletos com mensagens que seriam de Marighella foram encontrados onde explodiu a outra bomba da madrugada de 17 de dezembro de 1968.

O petardo foi colocado na porta do prédio da Anderson, Clayton & Company no centro de São Caetano do Sul. Com a detonação, a porta de ferro foi bastante danificada. Vários vidros do edifício também ficaram quebrados.

Antes disso, os agentes estavam empenhados em averiguar uma falsa ameaça.

Uma ligação telefônica anônima, por volta das 23h, informava que uma bomba seria jogada na empresa Matarazzo Rayon (a cerca de 2,5 quilômetros da Anderson) em dez minutos.

Com isso, viaturas da Rádio-Patrulha, dos Bombeiros e da Polícia Civil se dirigiram para o local para realizar as buscas, tomando um drible.

A polícia só ficou sabendo do verdadeiro ataque por volta das 3h30 com um telefonema de um morador da região.

O Dops (Departamento de Ordem Política e Social) foi avisado do ataque pela delegacia de São Caetano, mas o delegado de plantão não pôde ir ao local de prontidão, porque estava ocupado no caso da praça 14 Bis.

O chefe da Polícia Federal em São Paulo, o general Silvio Correia de Andrade, disse acreditar que foi o mesmo grupo que realizou as duas ações.

Independentemente de quem foi o autor da ação em São Caetano, o fato foi que mais uma vez a ditadura voltou a ser desafiada em 1968.

Prédio da Anderson, Clayton em São Caetano depois do ataque – Reprodução

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1968 – A PRIMEIRA BOMBA: Explosão no Consulado dos EUA deixa feridas abertas até hoje

1968 – A SEGUNDA BOMBA: Depois de alarme na Polícia Federal, explosão atinge coração da Força Pública

1968 – A TERCEIRA BOMBA: Explosão endereçada ao 2º Exército fere 2 pessoas

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1968 – 27ª BOMBA: Jato de fogo em área da Aeronáutica gera especulações https://acervofolha.blogfolha.uol.com.br/2018/11/24/1968-27a-bomba-jato-de-fogo-em-area-da-aeronautica-gera-especulacoes/ https://acervofolha.blogfolha.uol.com.br/2018/11/24/1968-27a-bomba-jato-de-fogo-em-area-da-aeronautica-gera-especulacoes/#respond Sat, 24 Nov 2018 09:00:45 +0000 https://acervofolha.blogfolha.uol.com.br/files/2018/11/CampodeMarte-320x213.jpg https://acervofolha.blogfolha.uol.com.br/?p=10495 Apesar de 1968 ter sido um período marcado por bombas em São Paulo, uma explosão no Parque da Aeronáutica no Campo de Marte (zona norte de São Paulo), na noite de 25 de novembro daquele ano, não gerou muito alarme nas autoridades. Pelo menos, publicamente.

No dia seguinte ao fato, a Folha da Tarde divulgou que duas bombas foram detonadas no local e que o assunto estava sendo mantido em sigilo pela Aeronáutica para não provocar pânico na região.

Depois, veio a versão oficial: uma explosão ocorreu em um buraco de um terreno vazio no Campo de Marte. Porém não foi explicado o que provocou o estouro nem quem foram os autores.

Esse caso se juntou a outros 26 registros de explosivos e bombas, ocorridos na região metropolitana paulista desde março a novembro de 1968 (o quarto ano da ditadura militar no Brasil).

O levantamento foi realizado pelo Banco de Dados, e os episódios estão sendo publicados no Blog do Acervo da Folha.

Clique na imagem e confira o mapa das bombas em São Paulo em 1968

A misteriosa explosão em uma zona de segurança da Aeronáutica gerou muitas especulações.

O então chefe da Polícia Federal em São Paulo, o general Silvio Correa de Andrade, recusou-se a comentar a possibilidade de ligação com algum outro atentado anterior.

“Não fui solicitado pelas autoridades da Aeronáutica nem sei qual tipo dos artefatos, o material utilizado, o estrago causado e outros detalhes para fazer uma comparação com a [bomba] do consulado americano, a do Estadão e as que foram lançadas contra os quartéis do 2º Exército”, declarou na época o general, citando alguns atentados que estavam sob investigação.

Segundo o relato do delegado Wanderico Arruda de Moraes, o Dops (Departamento de Ordem Política e Social) foi chamado no dia 25 de novembro para atender a um acidente com um garoto atingido por um jato de fogo, vindo de um buraco num terreno baldio. Não foi revelada a gravidade dos ferimentos no garoto.

Edição da Folha da Tarde de 27 de setembro de 1968

Um tenente-coronel apontou que a explosão pode ter sido causada por um obus (uma espécie de granada explosiva que era arremessada por boca de fogo) enterrado no local em 1932, ano da Revolução Constitucionalista. Também informou que um buraco de um metro e meio no terreno ficou aberto e que só um menino foi queimado.

Oficiais da 4ª Zona Aérea disseram acreditar que a explosão tenha sido provocada pelo garoto que estaria brincando nas imediações do Campo de Marte.

Já o delegado-adjunto Orlando Rosante cogitou a possibilidade de ter ocorrido uma combustão espontânea com gases acumulados no local.

O Dops desligou-se do caso. As autoridades da Força Aérea Brasileira negaram-se a considerar que tenha sido um ação política e preferiram não comentar o fato por causa da sua “pequena importância”. E, assim, mais uma bomba ficava sem solução.

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1968 – DA 24ª À 26ª BOMBA: Após dois meses, explosivos na Água Branca e na Bela Vista voltam a intrigar o Exército https://acervofolha.blogfolha.uol.com.br/2018/10/31/1968-da-24a-a-26a-bomba-apos-dois-meses-explosivos-na-agua-branca-e-na-bela-vista-voltam-a-intrigar-o-exercito/ https://acervofolha.blogfolha.uol.com.br/2018/10/31/1968-da-24a-a-26a-bomba-apos-dois-meses-explosivos-na-agua-branca-e-na-bela-vista-voltam-a-intrigar-o-exercito/#respond Wed, 31 Oct 2018 15:00:09 +0000 https://acervofolha.blogfolha.uol.com.br/files/2018/10/Bomba1-320x213.jpg https://acervofolha.blogfolha.uol.com.br/?p=10447 O final de outubro de 1968 marcou a volta dos casos de grande repercussão de bombas em São Paulo. Uma explodiu na loja Sears, na Água Branca (zona oeste), no dia 27, sem provocar vítimas. Outras duas foram encontradas, sem serem detonadas, na Bela Vista (região central), no dia 31.

Essas ações representaram o fim de mais de dois meses sem notícias assim nos jornais naquele ano.

Os últimos haviam sido no dia 19 de agosto, com explosões em frente ao Dops (Departamento de Ordem Política e Social) e nos fóruns da Lapa e de Santana –os três foram de madrugada.

Conforme levantamento feito pelo Banco de Dados, foram feitos, ao menos, 26 registros de bombas, entre março e outubro de 1968 -era o quarto ano dos militares no poder. Essas histórias estão sendo resgatadas e publicadas no Blog do Acervo Folha.

Depois do atentado no Dops, a polícia prendeu um grupo de extrema direita acusado de provocarem, pelo menos, 13 ataques a bomba.

O líder do grupo, o escritor Aladino Félix, afirmou que as explosões eram determinadas pela Casa Militar da Presidência da República e que ele era apenas um intermediário.

Clique na imagem e confira o mapa das bombas em São Paulo em 1968

Quando uma explosão voltou a ocorrer, com o episódio na loja Sears, surgiu novamente a dúvida se havia um cunho político.

Para o delegado Edward Quass, do Dops, o “atentado era obra de pessoas interessadas no endurecimento do regime militar”, independentemente se tivesse sido feito por integrantes extremistas da direita ou da esquerda.

O ataque foi feito de madrugada. Uma bomba explodiu em uma das portas de aço que protegem as vitrines da loja, destruindo vários aparelhos eletrodomésticos. Um cano também foi rompido. A água jorrou pelo local, alagando os porões.

Segundo cálculos dos diretores da Sears, os prejuízos causados eram de mais de NCr$ 30.000 (o que equivaleria a aproximadamente R$ 240 mil).

Os vidros das janelas de uma empresa vizinha quebraram com o deslocamento de ar. Isso também ocorreu em residências próximas.

Foram recolhidos os fragmentos da bomba, uma peça de aço, pedaço de um cano, papéis com o emblema das Forças Armadas e em um deles havia a inscrição: Ministério da Guerra, Fábrica de Explosivos do Exército, Piquete.

A hipótese de que o artefato teria sido lançado por um Volkswagen, que tinha passado momentos antes da explosão, foi deixada de lado, já que a bomba era muito pesada.

Quatro dias depois, a polícia ganhou um outro mistério para tentar desvendar. Duas bombas, de alto poder destrutivo, foram encontradas de madrugada perto de um estacionamento de carros na rua Paim, na Bela Vista.

Elas estavam escondidas embaixo de um monte de pedras, o que, segundo policiais, aumentaria o poder de ação quando explodisse, porque gerariam muitos estilhaços.

Bombas estavam debaixo de um monte de pedras

O Exército não informou como as descobriu lá. Durante a madrugada, oficiais do Serviço Secreto foram até o local,  começaram a a cavar as pedras, cuidadosamente, até que acharam os dois petardos.

Houve um impasse para fazer a remoção das bombas. Os agentes militares queriam que a Polícia Técnica as desmontasse, mas não foram atendidos.

Um engenheiro da Polícia Técnica alegou que elas poderiam explodir ao simples contato com mão e que as Forças Armadas tinham o equipamento necessário para a ação.

Quem fez esse trabalho foi a Polícia do Exército. Nenhum dos oficiais quis fazer alguma declaração para a imprensa, mas eles admitiram que “aquilo era obra de terrorista”.

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1968 – A NONA BOMBA: Polícia prende garoto com coquetel molotov após espetáculo ser censurado https://acervofolha.blogfolha.uol.com.br/2018/06/11/1968-a-nona-bomba-policia-prende-garoto-com-coquetel-molotov-apos-espetaculo-ser-censurado/ https://acervofolha.blogfolha.uol.com.br/2018/06/11/1968-a-nona-bomba-policia-prende-garoto-com-coquetel-molotov-apos-espetaculo-ser-censurado/#respond Mon, 11 Jun 2018 13:00:08 +0000 https://acervofolha.blogfolha.uol.com.br/files/2018/06/pacote-com-as-bombas-320x213.jpg http://acervofolha.blogfolha.uol.com.br/?p=9602 Na noite do dia 11 de junho de 1968, o quarto ano sob o comando da ditadura militar, o clima estava bastante tenso no Teatro Ruth Escobar, na Bela Vista, em São Paulo.

Com a ordem de impedir a apresentação da “1ª Feira Paulista de Opinião”, policiais foram ao teatro por volta das 18h.

Nesse espetáculo, com direção de Augusto Boal, os artistas levantavam a questão: “O que pensa o Brasil de hoje?”. E os militares não gostaram disso e proibiram a venda de ingresso e a apresentação.

Apesar do veto, os artistas conseguiram o aval do delegado regional do Departamento de Polícia Federal, o general Sílvio Correia de Andrade, para a realização de uma assembleia com a classe teatral no Ruth Escobar.

Por causa desse evento, a entrada do teatro estava cheia às 21h, quando uma agitação fora do prédio chamou a atenção. A polícia havia prendido um garoto, com uma bomba de fabricação caseira.

Essa é mais uma história, que está sendo recontada agora pelo Banco de Dados  no Blog do Acervo Folha, sobre a série de bombas naquele agitado período. Somente entre 19 de março e 11 de junho de 1968, foram registrados oito casos de explosões na cidade de São Paulo.

Clique aqui e confira o mapa das explosões em São Paulo em 1968

O rapaz preso pelos policiais no Teatro Ruth Escobar foi o estudante Eduardo Abramovay, de 17 anos, acusado de portar coquetel molotov, em cinco garrafas cheias, atadas por um estopim e camufladas num pacote de papel.

Prestes a completar 50 anos do episódio, ele falou que a sua vida mudou a partir daquele dia.

Segundo Abramovay, uma pessoa (ele diz não se lembrar o nome) havia lhe pedido para apenas transportar as bombas dentro de um embrulho até o teatro naquela noite e que alguém iria procurá-lo para recebê-la.

“Eu sabia que era coquetel molotov. Mas era muito moço, coloquei lá no carro, sem me preocupar em esconder direito”, disse.

Prisão

Ele afirmou que, assim que chegou ao teatro, os policiais olharam dentro do veículo e viram o pacote. Quando desceu do carro, acabou sendo enquadrado. “Não deu outra. Fui parar no Dops [Departamento de Ordem Política e Social]”, declarou.

Na época, agentes chegaram a divulgar que a bomba havia sido colocada ao lado do pneu direito da perua da Polícia Federal, mas ele nega essa versão. “Isso não aconteceu.”

Após ser levado pelos policiais, a assembleia da classe teatral acabou suspensa. Deputados que tinham ido prestar solidariedade aos artistas chegaram a dizer que o garoto era inocente.

Na entrada do teatro, o deputado estadual Fernando Perrone (MDB) gritava para multidão: “Alguém viu alguma bomba?”. A resposta vinha em coro. “Não!”

De nada adiantou o protesto. Abramovay ficou preso até o dia 4 de julho, quando o Superior Tribunal Militar concedeu um habeas corpus e o soltou.

“Não cheguei a ser torturado, mas apanhei. Levei uns tapas e socos no Dops”, comentou.

Ficou cerca de dois meses livre, mas teve que voltar para a prisão. Permaneceu detido por aproximadamente dois meses no Presídio Tiradentes.

Antes que fosse julgado, conseguiu outra vez uma liberdade provisória. “A minha família foi avisada que eu seria condenado, e, então, decidi mudar de país.”

Morou no Uruguai, na França, no Chile e novamente na França até que voltou para o Brasil em 1976, já sem chance de ser preso (ele havia sido condenado a três anos e meio de prisão).

Hoje, Abramovay tem 67 anos e é produtor audiovisual. “Não me arrependo de nada. Tudo o que eu vivi me serviu de aprendizado.”

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1968 – A OITAVA BOMBA: Explosão destrói banheiro de Centro de Alistamento da Força Pública https://acervofolha.blogfolha.uol.com.br/2018/05/18/1968-a-oitava-bomba-explosao-destroi-banheiro-de-centro-de-alistamento-da-forca-publica/ https://acervofolha.blogfolha.uol.com.br/2018/05/18/1968-a-oitava-bomba-explosao-destroi-banheiro-de-centro-de-alistamento-da-forca-publica/#respond Fri, 18 May 2018 10:00:31 +0000 https://acervofolha.blogfolha.uol.com.br/files/2018/05/FORCAS-320x213.jpg http://acervofolha.blogfolha.uol.com.br/?p=9566 Fim de noite de um sábado, 18 de maio de 1968, e mais uma bomba (a oitava em dois meses) foi detonada em São Paulo. Desta vez, ela foi jogada no Centro de Alistamento da Força Pública.

O artefato explodiu às 23h no banheiro do prédio, localizado na rua Jorge Miranda, número 74, na Luz, em São Paulo, mas não provocou vítimas.

Da série de sete explosões ocorridas na cidade anteriormente, seis ocorreram de noite ou de madrugada: na Bolsa de Valores de São Paulo, em um ônibus depois do aumento da passagem, na casa de um ex-procurador do estado, na sede do jornal O Estado de S.Paulo, no quartel-general da Força Pública, no Consulado dos Estados Unidos.

A outra explosão ocorreu no fim de tarde, às 17h45, em um prédio vizinho ao 2º Exército.

As histórias dessas explosões que intrigavam a ditadura militar (que em 1968 estava em seu quarto ano) estão sendo recontadas agora pelo Banco de Dados no Blog do Acervo Folha.

Governos, Exército, Polícia Federal, Dops (Departamento de Ordem Política e Social), Força Pública tentavam impedir ações de guerrilhas urbanas naquele período.

Clique aqui e confira o mapa das explosões em São Paulo em 1968

Versões desencontradas 

A bomba no Centro de Alistamento foi cercada de mistério e de versões desencontradas das autoridades.

A Força Pública informou que a explosão deslocou a porta do banheiro, mas um tenente revelou também que o vaso sanitário foi destruído, partido em vários pedaços, e que ficou um buraco no chão.

Os jornalistas não tiveram acesso ao local da explosão.

Outro ponto que chamou a atenção foi o fato de o sargento de plantão ter atendido a um telefonema, bem na hora do estouro, de uma ligação feita por engano.

Pedaços de papel grosso encontrados no local levaram inicialmente as autoridades a dizer que acreditavam que se tratava de uma dessas bombas soltadas em festas juninas, porém das mais potentes, e que a ação seria apenas uma brincadeira.

Só que essa versão foi vista com desconfiança por um tenente por achar que a bomba era muito forte.

O Centro de Alistamento era um lugar frequentado por civis, e as crianças costumavam jogar futebol no pátio.

Detenção

No dia seguinte da ação, domingo (19), um homem chegou a ser detido na rua Major Quedinho, no centro. Ele falava alto sobre bombas e dizia ter mapas que indicariam onde seriam as próximas explosões em São Paulo.

Depois de ser levado à delegacia, foi logo liberado. As autoridades concluíram que o homem estava embriagado e que os mapas, mal feitos, não estavam ligados a explosões nem tinham nenhum valor.

Não era brincadeira

Na segunda-feira (20), a Polícia Técnica contrariou a versão de “bomba junina”, informando que o artefato havia sido feito com canos e com dinamite, semelhante ao jogado na Bolsa de Valores, no dia 15 de maio. Portanto a potência não era pequena.

Novamente, os autores do ataque não foram identificados.

 

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1968 – A SÉTIMA BOMBA: Explosão na Bolsa de Valores de São Paulo arrebenta 59 vidraças https://acervofolha.blogfolha.uol.com.br/2018/05/15/1968-a-setima-bomba-explosao-na-bolsa-de-valores-de-sao-paulo-arrebenta-59-vidracas/ https://acervofolha.blogfolha.uol.com.br/2018/05/15/1968-a-setima-bomba-explosao-na-bolsa-de-valores-de-sao-paulo-arrebenta-59-vidracas/#respond Tue, 15 May 2018 10:30:53 +0000 https://acervofolha.blogfolha.uol.com.br/files/2018/05/OU_Image100201-F-320x213.jpg http://acervofolha.blogfolha.uol.com.br/?p=9548 Um dos símbolos do capital financeiro, a Bolsa de Valores de São Paulo foi atingida por uma bomba às 22h de 15 de maio de 1968. Tratava-se da sétima explosão na cidade, em um período de dois meses, em um conturbado ano.

A ação arrebentou 59 vidraças, mas não houve vítima. A entidade funcionava, à época, no edifício da Secretaria de Agricultura, localizado no Pateo do Collegio, próximo à Central da Polícia. Ninguém foi preso.

“Só pode ser um ato visando fins propagandísticos, uma vez que, a essa hora da noite, não há ninguém no prédio”, disse o então presidente da Bolsa de Valores, Osorio de Oliveira Sobrinho.

As histórias de bombas detonadas em São Paulo em 1968 estão sendo recontadas agora pelo Banco de Dados no Blog do Acervo Folha.

Naquele ano, mais de 20 explosões desafiaram os governos federal e estadual, o Exército, a Polícia Federal, o Dops (Departamento de Ordem Política e Social), a Força Pública, delegacias da cidade e autoridades.

Era o quarto ano da ditadura militar no Brasil, e as guerrilhas urbanas estavam atuantes.

Clique aqui e confira o mapa das explosões em São Paulo em 1968

15 de maio de 1968

Quando a bomba explodiu na Bolsa de Valores, dois policiais da radiopatrulha estavam com o carro estacionado no viaduto da rua Boa Vista, a aproximadamente 100 metros do local.

Eles escutaram o barulho e pensaram, primeiramente, que eram estouro de um pneu. No entanto viram a fumaça. Como era perto, foram de marcha à ré ao prédio da explosão.

Ao chegar, os policiais foram conferir o que realmente tinha acontecido e se alguém tinha se ferido.

Depois disso, eles iniciaram a busca por suspeitos e encontraram uma testemunha, um garoto de 17 anos correndo.

O rapaz trabalhava como mensageiro de uma empresa telegráfica e, à noite, estudava arte culinária no Senac (Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial). Ele entrou na viatura e explicou que estava correndo de medo.

Contou que tinha saído da escola e estava andando em direção ao Parque Dom Pedro para pegar um ônibus e voltar para sua casa, em Engenheiro Goulart (zona leste).

Os estilhaços da bomba são recolhidos e o local fotografado pelos especialistas (Reprodução/Folhapress)

Conflito de versões

A versão inicial divulgada pela imprensa era a de que o garoto tinha declarado que um sujeito alto, magro, cabelos grisalhos, vestindo uma japona, com uma pasta, andava perto da entrada da Bolsa e que, momentos antes da explosão, o homem teria começado a correr em fuga.

O rapaz teria também declarado aos policiais ter visto o suspeito se encontrando com outros dois companheiros na ladeira da rua General Carneiro.

No dia seguinte, o garoto prestou depoimento de duas horas no Dops (Departamento de Ordem Política e Social) e negou essas informações.

Afirmou que não viu o suspeito de perto, não sabia informar a roupa exata nem dizer se o homem estava acompanhado ou sozinho.

“Na rua Alvares Penteado, um homem alto, de roupa esporte, passou por mim. Chovia, estava escuro, o homem sumiu. Pouco depois, quando comecei a descer a General Carneiro, ouvi a explosão e corri ladeira abaixo”, disse a testemunha.

Depois, ele mudou novamente a versão e afirmou ter visto o homem correndo na mesma rua.

“Vi um homem correr quando a bomba explodiu, mas sei lá se era terrorista ou estava correndo de medo como eu”, afirmou o garoto.

Assim como nas explosões anteriores no ano, a polícia ficou sem muitas pistas sobre os autores dos ataques, e o caso entrou no rol das “bombas misteriosas”.

Explosões parecidas

No entanto o general Silvio Correia de Andrade, delegado na Polícia Federal, acreditava que a série de atentados em 1968 eram promovidos pelo mesmo grupo.

“O processamento das explosões é o mesmo. Colocam as bombas em lugares ermos, altas horas da noite”, disse.

“A natureza dos explosivos também é a mesma. São de fabricação caseira, quase sempre canos de ferros com luvas para engates contendo pólvora ou dinamite. Os estilhaços são muito parecidos, em todos os casos. Dá a impressão de ser uma continuação de uma série de atentados iniciada com a explosão no Consulado Americano”, declarou.

 

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1968 – A SEXTA BOMBA: Coquetel molotov é jogado em ônibus após aumento de passagem https://acervofolha.blogfolha.uol.com.br/2018/05/07/1968-a-sexta-bomba-coquetel-molotov-e-jogado-em-onibus-apos-aumento-de-passagem/ https://acervofolha.blogfolha.uol.com.br/2018/05/07/1968-a-sexta-bomba-coquetel-molotov-e-jogado-em-onibus-apos-aumento-de-passagem/#respond Mon, 07 May 2018 10:00:48 +0000 https://acervofolha.blogfolha.uol.com.br/files/2018/05/banco-de-ônibus-320x213.jpg http://acervofolha.blogfolha.uol.com.br/?p=9307 Durante a madrugada de 6 de maio de 1968, São Paulo voltou a registrar uma explosão, a sexta em menos de dois meses.

Depois de serem atingidos os prédios do Consulado dos Estados Unidos, da Força Pública, do 2º Exército, do jornal O Estado de S.Paulo e da casa de um ex-procurador do estado de SP, o alvo, desta vez, foi um ônibus.

A polícia não prendeu ninguém nesta ação, mas encontrou no local da explosão vários panfletos de protesto contra o aumento na tarifa do transporte público.

O preço das passagens dos ônibus foi majorado em 25% por decisão do prefeito Faria Lima e entrou em vigor no dia 5 de maio de 1968. Passou de NCr$ 0,20 (equivalente a R$ 1,68) para NCr$ 0,25 (R$ 2,10).

Clique na imagem e confira o mapa das explosões em São Paulo em 1968

O ataque ao ônibus não feriu ninguém nem causou grandes prejuízos, mas a situação poderia ter sido bem mais grave.

Um coquetel molotov foi atirado contra um ônibus que estava estacionado ao lado de mais de cem veículos no pátio da empresa Viação Urbana Penha, na avenida Gabriel Mistral, na Penha da França, na zona leste de São Paulo.

O produto não explodiu totalmente e provocou só um pequeno incêndio, logo apagado pelos funcionários da companhia.

O Dops (Departamento de Ordem Política e Social) e a Polícia Técnica foram até lá e encontraram uma garrafa quebrada, ainda com resto da substância química, além de panfletos contra o novo no preço das passagens.

De acordo com um vigia da empresa, dois carros saíram em disparada logo depois da explosão, um Fusca e um Gordini.

O ano de 1968 foi o quarto da ditadura militar no Brasil, e a polícia e o Exército buscavam conter as ações das guerrilhas urbanas que lutavam contra o regime.  Com a série de explosões em São Paulo (que estão sendo recontadas agora pelo Banco de Dados no Blog do Acervo Folha), o temor de mais atentados era grande.

No mesmo dia ao ataque do ônibus, a notícia de uma bomba no Parque do Estado causou grande apreensão. O objeto encontrado, porém, foi uma granada enferrujada, que, de acordo com a polícia, devia ter sido enterrada naquela área havia muitos anos.

Outro susto foi tomado no dia anterior. Policiais foram avisados de um explosivo sob o pontilhão do Pavilhão Internacional do Ibirapuera.

Agentes especializados em bombas foram chamados e viram que o objeto suspeito era apenas de uma lata furada, com um pedaço de pau fino. Segundo policiais, a lata parecia mais uma brincadeira do que um artefato.

Granada encontrada no Parque do Estado estava enferrujada – Folhapress

 

Veja também:

1968 – A PRIMEIRA BOMBA: Explosão no Consulado dos EUA deixa feridas abertas até hoje

1968 – A SEGUNDA BOMBA: Depois de alarme na Polícia Federal, explosão atinge coração da Força Pública

1968 – A TERCEIRA BOMBA: Explosão endereçada ao 2º Exército fere 2 pessoas

1968 – A QUARTA BOMBA: Impacto de explosão na sede de O Estado de S. Paulo atinge raio de 200 m

1968 – A QUINTA BOMBA: Bomba explode em casa de ex-procurador do Estado

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1978: Antes de assumir país, Figueiredo diz que ‘democracia plena não existe’ https://acervofolha.blogfolha.uol.com.br/2018/04/05/em-1978-ultimo-presidente-da-ditadura-disse-que-democracia-plena-nao-existe/ https://acervofolha.blogfolha.uol.com.br/2018/04/05/em-1978-ultimo-presidente-da-ditadura-disse-que-democracia-plena-nao-existe/#respond Thu, 05 Apr 2018 10:00:38 +0000 https://acervofolha.blogfolha.uol.com.br/files/2018/03/BHi_j0059__Figueiredo-320x213.jpg http://acervofolha.blogfolha.uol.com.br/?p=8806 Há 40 anos, o general João Baptista Figueiredo concedeu entrevista à Folha, seis meses antes de ser eleito presidente da República pelo Colégio Eleitoral.

O encontro que não deveria “ultrapassar o limite de 20 minutos”, conforme pedido do ajudante de ordens de Figueiredo, o capitão Marcon, durou mais de uma hora e meia. Não foi permitido usar gravador ou tomar anotações.

Durante 95 minutos, o futuro presidente falou sobre democracia, voto popular, opinião pública, abertura política, privatização, dentre outros assuntos.

Questionado qual seria a sua democracia, Figueiredo respondeu: “O princípio básico é que todo poder emana do povo. Eu não gostaria de dizer democracia relativa, mas o fato é que democracia plena não existe.”

Sobre a discussão das eleições indiretas, declarou que “o eleitor brasileiro ainda não tem o nível do eleitor americano, do eleitor francês.”

Quando os repórteres Getulio Bittencourt e Haroldo Cerqueira Lima perguntaram se ele reconhecia que havia uma aspiração nacional pela abertura, Figueiredo foi direto: “Sim, é verdade, essa aspiração existe”.

Os repórteres, que receberam o Prêmio Esso de jornalismo pela entrevista, também o questionaram se sua ideia sobre privatização havia acabado. “Não, continua”, respondeu Figueiredo. “Mas entregar para o empresário que é eficiente às custas do dinheiro, ou para os que são eficientes por serem testas-de-ferro das multinacionais, não podemos.”

O resultado da entrevista foi publicado em dois dias, em 5 e 6 de abril de 1978 e pode ser lido no Acervo Folha.

Primeira página da Folha de S.Paulo de 5 de abril de 1978 (Folhapress)
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Repórter da Folha foi preso e torturado em delegacia de Guarulhos há 40 anos https://acervofolha.blogfolha.uol.com.br/2018/03/05/reporter-da-folha-foi-preso-e-torturado-em-delegacia-de-guarulhos-ha-40-anos/ https://acervofolha.blogfolha.uol.com.br/2018/03/05/reporter-da-folha-foi-preso-e-torturado-em-delegacia-de-guarulhos-ha-40-anos/#respond Mon, 05 Mar 2018 15:00:00 +0000 https://acervofolha.blogfolha.uol.com.br/files/2018/03/SOARES-2162-320x213.jpg http://acervofolha.blogfolha.uol.com.br/?p=8271 “Recebi socos, pontapés, pauladas e choques. Foram duas horas de terror.”

Foi o que disse o então repórter da Folha Milton Soares, após ter sido preso e torturado por nove detentos em uma cela da Delegacia Central de Guarulhos, na madrugada de 3 de março de 1978.

A prisão do repórter, feita de forma arbitrária pela polícia, foi uma retaliação do delegado titular Fausto Rainere, por causa de reportagens que o jornalista vinha publicando sobre casos de violência policial no município de Guarulhos (SP), onde era correspondente.

O episódio gerou grande repercussão na esfera política. Houve até protesto do deputado Paulo Kobayashi, que usou a tribuna da Assembleia Legislativa de São Paulo para se manifestar contra o comportamento da polícia.

Na Câmara Federal, o deputado Joaquim Bevilacqua clamou ao então secretário da Segurança Pública de São Paulo, Antônio Erasmo Dias, que responsabilizasse a polícia pela barbárie cometida contra o repórter.

O delegado titular da Delegacia Central de Guarulhos, Fausto Rainere (Foto: mar.1978/Folhapress)

DENÚNCIAS

Milton Soares vinha denunciando havia meses casos de arbitrariedades cometidas pela polícia de Guarulhos.

Em reportagem publicada em 13 de janeiro de 1978, o jornalista apurou o descaso com presos da Cadeia Pública de Guarulhos, que faziam greve de fome por razão de maus-tratos.

Ele denunciou que do lado do muro lateral direito do presídio, próximo ao portão por onde entravam as visitas dos detentos, “havia várias roupas e colchões rasgados e dezenas de garrafas térmicas quebradas”.

No mesmo dia, o repórter acompanhou a ida de cerca de 40 familiares de presos até o Fórum de Guarulhos para denunciar a negligência com os entes detentos. Eles reclamaram que na madrugada anterior os presos tinham sido submetidos a jatos de água gelada durante meia hora, e tiveram todos os seus pertences destruídos por policiais.

UM TÚNEL NA DELEGACIA

O conflito entre as autoridades e o jornalista, contudo, havia começado dias antes, quando Milton Soares publicou reportagem sobre  o escavamento de um túnel na Delegacia Central de Guarulhos, o que provocou a ira do titular da casa, Fausto Rainere.

“Tudo indica que o túnel havia começado há algum tempo, pois ele estava com aproximadamente 40 centímetros, e, para ganhar as ruas, os presos intencionavam cavar mais dois metros. A terra removida na escavação era dispensada pela privada”, relatou Soares na reportagem.

Em outra publicação, denunciou que policiais de Guarulhos estavam utilizando veículos da corporação como táxis, e sem licença.

MENOR ESTRANGULADO

O caso mais grave levantado pelo correspondente foi o da morte do menor Arnaldo Ribeiro Rosa, 14, que foi vítima de estrangulamento na mesma delegacia onde o repórter acabou detido e violentado.

O assassinato do adolescente foi acobertado durante duas semanas pela polícia. Quando a notícia veio à tona, o juiz da 3ª Vara do Júri, Waldemar Nogueira Filho, decidiu abrir sindicância para apurar a morte do menor.

O diretor da Cadeia Pública de Guarulhos, Dercídio Ferreira (Foto: jun.1978/Folhapress)

A TORTURA

As várias ameaças vindas de terceiros através da polícia não intimidavam o jornalista.

Na noite da quinta-feira (2), horas antes de ser preso, Soares, que havia chegado à Delegacia de Guarulhos por volta das 19h como cumprimento de seu trabalho como repórter, foi escorraçado aos gritos pelo delegado Fausto Rainere após uma discussão.

Para evitar um impasse maior com o titular, o repórter até que tentou deixar a delegacia, mas o delegado, irritado com as denúncias, pediu aos investigadores que trouxessem Soares de volta à delegacia.

Levado ao pavimento superior do prédio, o jornalista foi autuado em flagrante por desacato à autoridade. O auto de prisão foi presidido pelo delegado Antônio Carlos da Silva.

“Não vi nenhum desacato ao delegado, por parte do Milton. Muito pelo contrário, ele ficou o tempo todo de cabeça baixa. Do lado de fora escutei o delegado falando alto e soltando impropérios”, contou o motorista Daniel Juvêncio dos Santos, que acompanhava Soares naquele dia e que conseguiu observar a discussão pela janela da delegacia.

O repórter Milton Soares, meses após a tortura (Foto: ago.1978/Folhapress)

ARTIGO 331

O flagrante foi lavrado entre as 19h e as 22h. Durante esse tempo ninguém pôde ter acesso à sala em que o repórter estava com os delegados.

Soares foi enquadrado no artigo 331 do código penal, que prevê pena de seis meses a dois anos de detenção. Mas, por se tratar de crime afiançável, o então advogado da Folha, Menaldo Montenegro, que defendeu o jornalista na ocasião, pagou a quantia de Cr$ 10 mil arbitrada pelo delegado Silva, o responsável pela sentença.

Já eram 11h30 da noite e, para que Soares fosse liberto, era necessário ainda consultar a Divisão de Vigilância e Capturas do DEIC (Departamento de Investigações Criminais) para saber se o jornalista era procurado pela Justiça. O resultado, negativo, chegou uma hora após a solicitação, mas ainda não foi o suficiente para a soltura do repórter.

Enquanto Montenegro aguardava na delegacia a burocracia para a libertação do jornalista, que naquele momento era colocado numa cela no fundo do prédio com outros nove presos e sem o conhecimento do advogado, o delegado de plantão, Benedito Wilson Carrico, disse que a liberdade de Soares só poderia ser efetivada com o aval do delegado Antônio Carlos da Silva, que foi a autoridade que presidiu a prisão do repórter e que já não se encontrava na delegacia.

Por volta das 2h, Soares já havia sido torturado durante duas horas pelos detentos, até que uma viatura policial teve que ser chamada para levá-lo às pressas para o Pronto Socorro de Guarulhos devido à gravidade do espancamento.

Horas depois o repórter foi encaminhado para o Hospital das Clínicas, onde, perto das 6h falou brevemente com a imprensa e com o presidente do Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Estado de São Paulo, Audálio Dantas.

O repórter Milton Soares após ser espancado por presos na Delegacia Central de Guarulhos (Foto: mar.1978/Folhapress)

Conforme a Folha relatou na época, “Soares apresentava vários hematomas e ferimentos por todo o corpo, principalmente no rosto e nas costas e mal articulava as palavras, pois estava com a boca bastante ferida”.

O jornalista disse aos repórteres que o flagrante contra ele fora forjado e “todas as testemunhas foram coagidas a favor do delegado Fausto Rainere”. Depois, Soares confirmou que quem o conduziu à cela foi o delegado Dercídio Inácio Ferreira, que o colocou “no pior xadrez da cadeia, o de número dez, onde ficavam os criminosos mais perigosos”.

Por fim, o jornalista declarou que, assim que foi jogado na cela, Ferreira disse aos detentos que ele os fotografara. Era a senha para o início de uma “sessão de pancadaria”, contou o repórter, que, mesmo gritando por socorro, não pôde contar com a assistência da polícia.

PAULO EGYDIO E ERASMO DIAS

O então secretário da Segurança Pública de São Paulo, o coronel Antônio Erasmo Dias, anunciou na ocasião que removeria toda a Polícia Militar de Osasco e a Civil de Guarulhos. “A polícia de Osasco já cometeu muitas arbitrariedades e a de Guarulhos, igualmente. Por isso temos de removê-las para ver se as coisas melhoram.”

O governador de São Paulo, Paulo Egydio Martins, também se manifestou sobre o episódio ao dizer que acompanharia o caso.

A VOLTA AO TRABALHO

Milton Soares só conseguiu retornar ao trabalho dois meses e 17 dias após a prisão. 

Em junho de 1978, 2.500 jornalistas assinaram manifesto da ABI (Associação Brasileira de Imprensa) contra a violência e censura à imprensa.

O repórter da Folha, Milton Soares, fala com jornalistas ao sair do Hospital das Clínicas (Foto: 4.mar.1978/Folhapress)

CONDENAÇÃO

Em fevereiro de 1979, os delegados Antônio Carlos da Silva e Dercídio Inácio Ferreira foram condenados a dez dias de detenção. O delegado Fausto Rainere, algoz maior do repórter, e o carcereiro Neal Vannuchi foram absolvidos. Já os nove presos envolvidos no espancamento tiveram suas penas ampliadas em mais seis meses de detenção.  

O delegado Antonio Carlos e o carcereiro Neal Vannuchi (com o rosto coberto) após depoimento no Fórum de Guarulhos (Foto: 20.jun.1978/Folhapress)

 

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Há 95 anos, nascia Sérgio Porto, criador do satírico inimigo da ditadura Stanislaw Ponte Preta https://acervofolha.blogfolha.uol.com.br/2018/01/11/ha-95-anos-nascia-sergio-porto-criador-do-satirico-inimigo-da-ditadura-stanislaw-ponte-preta/ https://acervofolha.blogfolha.uol.com.br/2018/01/11/ha-95-anos-nascia-sergio-porto-criador-do-satirico-inimigo-da-ditadura-stanislaw-ponte-preta/#respond Thu, 11 Jan 2018 07:00:02 +0000 https://acervofolha.blogfolha.uol.com.br/files/2018/01/PORTO-3586-152x180.jpg http://acervofolha.blogfolha.uol.com.br/?p=7277 Humorista, apresentador de televisão, jornalista, funcionário público, cronista e crítico musical, Sérgio Marcus Rangel Porto deixou sua marca na imprensa brasileira. Carioca do bairro de Copacabana, nascido em  11 de janeiro de 1923, ele criou o famoso personagem Stanislaw Ponte Preta em 1951, quando trabalhou no “Diário Carioca”. Na metade da década de 1950, passou a escrever para o jornal “Última Hora” e manteve sua coluna até sua morte, em 30 de setembro de 1968, quase três meses antes do AI-5,  ato que deu mais poderes à ditadura militar.

“Stanislaw é internacional, esse realmente não nasceu em lugar nenhum. Aliás, o berço de Stanislaw é o ‘Diário Carioca’, foi na maternidade do ‘Diário Carioca’ que ele nasceu”, afirmou Sérgio Porto em entrevista que reuniu Rubem Braga, Vinicius de Moraes, Fernando Sabino e José Carlos de Oliveira na redação da revista “Realidade”, em janeiro de 1968. O jornalista ainda revelou que o ilustrador Tomás Santa Rosa teve a ideia de colocar o “S” no começo e o “W” no fim do nome Stanislaw, personagem de críticas ácidas ao regime militar e que ultrapassou a popularidade de seu criador.

“Gosto mais do Sérgio porque ele é muito mais gente, né? Mas é tudo muito natural. O que acontece é que o Stanislaw é popular e vende tudo muito bem: livro, disco, show, piada.  Aí, ele parece existir mais. Antigamente, por exemplo, muita gente não sabia quem era Stanislaw. […] Hoje todo mundo sabe que um é o outro, não tem mais aquele mistério. Quer dizer, o Stanislaw resiste ao Sérgio, entende? Mas não acaba com ele não”, disse Porto em entrevista reproduzida no livro “Revista do Lalau, organizado por Luíz Pimentel e lançado em 2008.

A “Revista do Lalau também registra a seleção “As Certinhas do Lalau”, feita pelo “mulherólogo” Ponte Preta. “Nascidas como ‘As Mais Bem Despidas do Ano’ na revista ‘Manchete’, em 1954, as ‘certinhas’ se tornaram uma ‘coqueluche’ nacional, uma expressão da época”, afirma o jornalista Caio Jobim em reportagem da Folha.

Durante sua trajetória, Sérgio Porto utilizou seu heterônimo para publicar livros como “Tia Zumira e Eu”, “Primo Altamirando e Elas”, “Bonifácio, o Patriota”, “O Garoto Linha Dura” e a série “Febeapá (Festival de Besteira que Assola o País)”, entre outros. Com seu nome, Porto escreveu “Pequena História do Jazz”,  “O Homem ao Lado” e “As Cariocas”, que em 2010 foi adaptado pelo diretor Daniel Filho para uma série de dez episódios da TV Globo,  e “A Casa Demolida”, livro que aborda as mudanças em Copacabana e em sua própria residência.

Com histórias repletas de sátiras, as colunas e crônicas de Stanislaw Ponte Preta desconstruíam o discurso do regime militar com exemplos simples de resistência no cotidiano dos cariocas. As representações da realidade criadas pelos oficiais da ditadura sempre estavam na mira de Ponte Preta.  A série “Febeapá (Festival de Besteira que Assola o País)”, sucesso de vendas no país,  mostram a acidez e o humor do cronista.

“Se vivo fosse, Stanislaw teria hoje material para uns 500 festivais por dia, tal o nível de besteiras que caracteriza a política brasileira”, disse o jornalista Clóvis Rossi na coluna “Saudades do Stanislaw, de 2005, em que aborda a atualidade da obra de Sérgio Porto em meio ao cenário político brasileiro do século 21.

CRIOULO DOIDO

Em 1968, Sérgio Porto compôs o  “Samba do crioulo doido” para o musical “Pussy Pussy Cats”. A música é uma crítica ao Departamento de Turismo da Guanabara que obrigava as escolas de samba a desfilarem só com enredos inspirados em fatos históricos. “É difícil encaixar nomes, datas e acontecimentos passados dentro de uma melodia”, explicou Porto no espetáculo “O Show do Crioulo Doido”.

“Este samba é o samba do crioulo doido. A história de um compositor que durante muitos anos obedeceu ao regulamento e só fez samba sobre a História do Brasil. E tome de Inconfidência, Abolição, Proclamação, Chica da Silva e o coitado do crioulo tendo que aprender tudo isto para o enredo da escola. Até que, no ano passado, escolheram um tema complicado: a atual conjuntura. Aí o crioulo endoidou de vez e saiu este samba…”, fala o locutor na introdução da música de Sérgio Porto.

“Samba do crioulo doido” virou um clássico da música brasileira e foi interpretado pelos grupos Quarteto em Cy e Demônios da Garoa, entre outros. A música de Sérgio Porto tornou-se sinônimo de confusão e falta de discernimento.

Em maio de 2005, o Governo Lula lançou a cartilha “Politicamente Correto, manual que lista expressões do dia-a-dia que devem ser evitadas pela conotação pejorativa ou discriminatória para determinados grupos da sociedade.

A expressão “Samba do crioulo doido” entrou no manual. De acordo com a cartilha, a frase passou também a ser usada para discriminar os negros, atribuindo-lhes confusões e trapalhadas.

HOMEM TÍMIDO

Totalmente inserido na mídia de massa que crescia no Brasil, Sérgio Porto participou da programação da TV Rio, TV Tupi, TV Excelsior e TV Globo, além de trabalhar na rádio Mayrink Veiga. O cronista também é lembrado por sua energia, discrição, timidez e entrega ao trabalho. “Nunca consegui saber o segredo: como é que ele conseguia dosar uma tal capacidade de trabalho com aquela tranquilidade de monge. Era impecável na aparência e só os muitos íntimos o conheciam por dentro”, afirmou o poeta e amigo Paulo Mendes Campos (1922-1991).

“Papai nasceu, viveu e morreu na rua Leopoldo Miguez, em Copacabana. Era um homem muito bem-humorado, brincalhão, de uma ironia que surpreendia e a todos fazia rir, mas, paradoxalmente, tímido para determinadas situações em que tivesse que se expor. Aqueles que acompanhavam suas divertidas crônicas pelos jornais não podiam imaginar que, por trás de suas páginas, escondia-se um homem acanhado com o público”, contam as filhas de Sérgio Porto, a historiadora Ângela Porto e sua irmã Gisela Porto, no caderno Ilustríssima de 2013.

 

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