Folha diz como Thatcher virou “A Dama de Ferro”
David Cameron deixa o cargo de primeiro-ministro nesta quarta-feira (13), em virtude do plebiscito que definiu a saída do Reino Unido da União Europeia. Em seu lugar assume Theresa May, segunda mulher alçada a premiê na história local, quase 26 anos após a também conservadora Margaret Thatcher deixar o poder.
Thatcher ficou conhecida como “A Dama de Ferro”, apelido dado pelo jornalista militar soviético Yuri Gavrílov em artigo homônimo publicado em 24 de janeiro de 1976 no jornal russo “Krásnaya Zvezda”. E foi uma das figuras públicas mais influentes do século 20, quando comandou o Reino Unido de 1979 a 1990.
Durante estes 11 anos, a primeira-ministra ficou marcada por sua política de privatização das empresas estatais e pelo enfraquecimento dos sindicatos. Ela foi responsável pela redução do papel do Estado, inclusive em questões de cunho social. Porém milhares de britânicos conseguiram comprar casas populares graças ao fomento proporcionado pelo seu governo.
A “Dama de Ferro” também era incentivadora do livre mercado, e suas políticas inspiraram vários países do Ocidente. Por outro lado, lutou contra uma maior integração da União Europeia e fez campanha contra o euro, com o intuito de evitar a perda da soberania britânica para Bruxelas, capital da União Europeia.
Nascida no condado de Lincolnshire em 13 de outubro de 1925, filha de um dono de mercearia e político local, Margaret Hilda Thatcher estudou química em Oxford, onde se tornou a terceira mulher a alcançar a presidência da Associação Conservadora da universidade.
A consolidação de sua veia política se deu a partir de 1949, quando passou a concorrer pelo Partido Conservador a cargos no governo de Kent, condado próximo de Londres. Apesar de chamar a atenção por ser a mais jovem candidata conservadora, ela não conseguiu se eleger.
Mas, no ano de 1959, ela finalmente conseguiu uma cadeira no Parlamento britânico. Antes disso, em 1951, havia se casado com o empresário Denis Thatcher, com quem teve os gêmeos Mark e Carol. Já o cume da política do Reino Unido foi alcançado em maio 1979.
A sua trajetória como primeira-ministra teve altos e baixos, como no final de 1981, quando sua taxa de aprovação caiu para 25%, a menor de um premiê até então. Mas a vitória dos britânicos contra a Argentina na Guerra das Malvinas, no ano seguinte, com apenas dois meses e meio de conflito, reverteu essa impopularidade. A rápida ação de Margarete Thatcher contou, inclusive, com apoio da oposição, num dos raros momentos de unidade entre conservadores e trabalhistas. O sucesso de suas ações, somado aos problemas enfrentados pelo Partido Trabalhista, a ajudaram em sua reeleição.
A premiê ainda chegaria a um terceiro mandato em 1987. Mas este poderia nem ter acontecido: um atentado a bomba em 12 de outubro de 1984, de autoria do IRA (Exército Republicano Irlandês), matou quatro pessoas e feriu outras 34 durante congresso do Partido Conservador, realizado no Grand Hotel, em Brighton. Por sorte, “A Dama de Ferro” escapou ilesa.
O governo de Margaret Thatcher chegou ao fim em novembro de 1990, quando, aos 65 anos, renunciou: “Tendo consultado amplamente meus colegas, cheguei à conclusão de que a unidade do partido e as perspectivas de vitória numa eleição serão melhor atendidas com a minha renúncia”, disse em nota oficial, após pressão dos próprios conservadores. Sua luta contra o aumento de poder da União Europeia e o Euro foram fatores determinantes para sua queda.
Logo após deixar o poder, a então ex-primeira-ministra recebeu o título de baronesa e escreveu dois livros. Ainda participativa, teve que se afastar da política em 2001, em decorrência de uma série de derrames. Dois anos depois, ela perdeu o marido, Denis.
Para alguns, descrita como a responsável por restaurar a força dos britânicos perante ao mundo e, para outros, tida como culpada pelo enfraquecimento do “Welfare State” (Estado de bem-estar social), Margaret Hilda Thatcher morreu em 2013, aos 87 anos, em Londres, vítima de um derrame cerebral.
Na época, Clovis Rossi escreveu em sua coluna na Folha que a morte da ex-premiê “acentua a orfandade de uma direita que era inflexível, não burra”. Já o jornalista Bernardo Mello Franco destacou sua pregação à liberdade na União Soviética, mas lembrou que ela apoiara ditaduras de direita, como a do general Augusto Pinochet, no Chile.
Ícone dos neoliberais, a “Dama de Ferro” e seu legado não eram unanimidades nem entre os britânicos. A revista “The Economist” afirmou que ela liderou uma “revolução global” e que o mundo precisava de mais “thatcherismo”, já o jornal “The Guardian” a acusou de dividir a população e disse que seu ideário foi sinônimo de egoísmo e culto a ganância.