Há 40 anos, rolimãs corriam 1º campeonato em SP

Luiz Carlos Ferreira

“Palmas, gritos e um barulho ensurdecedor. Começa a corrida dos carrinhos de rolimã, que descem a ladeira Professor Carlos Gama, defronte ao cemitério do Morumbi a 100, 110 quilômetros por hora.”

Há 40 anos, no domingo de 17 de outubro de 1976, a Folha destacava o 1º Campeonato Aberto de Carrinho de Rolimã promovido pela Secretaria Municipal de Esportes de São Paulo, disputado na íngreme ladeira Prof. Carlos Gama, no “elegante” bairro do Morumbi, na zona sul da capital.

Jovens fazem treino na ladeira prof. Carlos Gomes, no Morumbi, na zona sul de São Paulo (Foto: 16.out.1965/Folhapress)
Jovens fazem treino na ladeira Prof. Carlos Gomes, no Morumbi, na zona sul de São Paulo (Foto: 16.out.1965/Folhapress)

Organizado pelo Rolimã Kart Clube, que contava à época com 600 associados, o campeonato realizava naquele domingo sua segunda eliminatória. A terceira e última seria disputada no sábado seguinte (23), e as edições com os finalistas ocorreram nos dias 29 e 30, também no mês de outubro.

As provas eram realizadas no período noturno, pois a prefeitura não autorizava o uso da ladeira antes das 20h. Os diretores do clube, Mário Roberto Lourenço e Celso Luz, aguardavam da Secretaria Municipal de Turismo, a indicação de outra pista para que as competições fossem feitas durante o dia.

Com 350 inscritos, o campeonato foi dividido em quatro categorias: menores de 18 anos, mulheres, homens e kart sem motor. O regulamento, dentre outras regras, tornava obrigatório o uso de capacete, luvas, carrinhos sem bico ou ponta e rolamentos “comuns” para o enfrentamento do percurso de cerca de 1.500 metros de descida.

“Acontecem acidentes graves nas competições. Não chega a haver morte porque o capacete protege o crânio, mas há braços e pernas quebrados em quase todo o final de semana”, relatou à época Mauro Chaulét, um dos finalistas do campeonato.

Jovens participam de competição no Jardim São Bento, na zona sul de São Paulo (Foto: 27.jun.1965/Folhapress)
Garotos competem no Jardim São Bento, em São Paulo
(Foto: 27.jun.1965/Folhapress)

A segurança do evento, conforme os organizadores, era de responsabilidade da prefeitura, que disponibilizava além de um forte policiamento, ambulâncias e serviços de alto-falantes durante as provas.

Praticadas inicialmente por jovens e crianças pobres das grandes capitais, as corridas de carrinhos de rolimã se difundiram de forma rápida entre a classe média.

 

 

PIONEIRA

Garoto participa de competição em uma das ladeiras do Jardim São Bento, na zona norte de São Paulo. (Foto: 19.abr.1965/Folhapress)
Garoto participa de competição em uma das ladeiras do Jardim São Bento, na zona norte de São Paulo. (Foto: 19.abr.1965/Folhapress)

A primeira competição com regras, conforme noticiado na Folha, ocorreu em 18 de abril de 1965, no Jardim São Bento, em Santana, na zona norte de São Paulo. Idealizada pelos jovens irmãos Rubens Joel e Daniel Silveira Penteado, diretores do então recém-criado Rolimãs Clube de São Paulo, a competição contava com 43 pilotos, entre eles concorrentes individuais e de equipes com nomes como “Caveirinha”, “Metralhas”, “Mau-Mau” e “Capetas”. O bairro de Santo Amaro, na zona sul da capital, também se tornou reduto de competições na época.

Tragédias envolvendo carrinhos de rolimã também foram destaques nas páginas da Folha. Em 3 de agosto de 1972, o garoto José Carlos dos Santos, de 9 anos, morreu atropelado por um ônibus quando descia a av. Cangaíba, em São Paulo.

Três anos antes, no Rio, em maio de 1969, o jovem estudante Nelson Lopes Filho, de 16 anos, havia sido atingido na cabeça com tiro de pistola 45 disparado pelo policial militar Carlos Henrique José Neto, quando chegava de carro com os amigos para mais uma sexta-feira de corridas na estrada do Corcovado.

Notando a presença de viaturas da polícia no local, Nelson, que portava carrinhos de rolimã e estava sem habilitação, tentou fazer um desvio com o veículo, que acabou se chocando contra um paredão. A porta do carro se abril e seu corpo projetado para fora. Com muito sangue em volta da cabeça, o jovem foi levado já morto para o hospital. O policial, que no Pronto Socorro declarou ter sido um acidente, horas depois, na Delegacia Distrital, confessou ter atirado contra o adolescente.

Em trecho da Estrada velha de Santos, jovens do ABC, na grande São Paulo, se arriscam com carrinhos de rolimã (Foto: Paulo Cerciari - 13.jul.1987/Folhapress)
Em trecho da estrada velha de Santos, jovens se arriscam com carrinhos de rolimã (Foto: Paulo Cerciari – 13.jul.1987/Folhapress)

Nos anos 80, com o asfaltamento de ruas nas periferias da Grande São Paulo, os carrinhos de rolimã se tornaram ainda mais populares no Estado.

Em julho de 1987, a Folha acompanhou 20 jovens do ABC paulista, que, aos domingos, com seus “possantes” brinquedos, arriscavam suas vidas ao descer um percurso de 4 km da rodovia Caminho do Mar, conhecida também como estrada velha São Paulo-Santos. Os carrinhos chegavam a atingir 60 km por hora.

Atendendo a reclamações de moradores do Imirim, na sul de São Paulo,  policiais fazem apreensão de carrinhos de rolimã no bairro (Foto: 15.abr.1970/Folhapress)
Atendendo a reclamações de moradores do Imirim, na zona sul de São Paulo, policiais fazem apreensão de carrinhos de rolimã no bairro (Foto: 15.abr.1970/Folhapress)

No final de 1994, quando a popularidade do “brinquedo” estava em baixa nos bairros periféricos da capital paulista, alunos da Escola Politécnica da USP (Universidade de São Paulo) promoveram o seu 20º Grande Prêmio de carrinhos de rolimã, que passou a ser o campeonato mais tradicional do gênero. Em 4 de junho deste ano a escola realizou a sua 60° competição.

 

No último dia 9 de outubro, o jornal “Agora” –do Grupo Folha–, publicou reportagem de Tatiana Cavalcanti, sobre a evolução dos carrinhos de rolimã e sua nova geração de adeptos, provando de vez que a velha e perigosa brincadeira não deverá abandonar tão cedo as pistas, ou melhor, as ruas.

Ex-taxista Ivair de Moura Chaves, 63, abandonou a profissão para se dedicar à fabricação de carrinhos de rolimã (Foto Júlia Chequer – 6.out.2016)
Ex-taxista Ivair de Moura Chaves, 63, que abandonou a profissão para se dedicar à fabricação de carrinhos de rolimã
(Foto Júlia Chequer – 6.out.2016/Folhapress)