Há 20 anos, morria Tim Maia, o ‘síndico’ mais famoso do Brasil
Em 15 de março de 1998, a música brasileira perdia a sua principal referência dos gêneros funk e soul produzidos no país. Sebastião Rodrigues Maia, o Tim Maia, um dos mais polêmicos personagem da MPB, morreu aos 55 anos, em decorrência de um choque séptico causado por uma infecção generalizada.
Cantor, compositor e multi-instrumentista, Tim Maia estava internado havia uma semana no hospital Universitário Antônio Pedro, em Niterói (RJ), após se sentir mal durante uma apresentação no Teatro Municipal de Niterói, quando cantava a primeira música do set list, “Não quero Dinheiro (Só quero Amar)”. O show seria gravado para um especial do canal de TV Multishow.
Muitos até riram pensando ser uma brincadeira do cantor, que pouco antes havia reclamado do retorno do som. Outros gritavam “chamem o síndico”, em referência ao apelido que Tim Maia ganhou do amigo Jorge Benjor, imortalizado na música “W/Brasil”. O cantor deixou três filhos, José Carlos, Telmo e Márcio Leonardo.
Nascido na Tijuca, no Rio, em 28 de setembro de 1942, Tim Maia era o 18º dos 19 filhos do casal Altivo Maia e Maria Imaculada Nogueira, donos de uma pensão na rua Afonso Pena, no mesmo bairro.
Na infância era chamado de Tião Marmiteiro, pelo fato de trabalhar como entregador de marmitas para a família.
TIJUCANOS, SNAKES E SPUTNIKS
A afinidade com a música começou aos 9 anos, quando Tim ganhou um violão de seu pai. Nessa época, ouvia Angela Maria, Cauby Peixoto, Silvio Caldas e Anísio Silva entre outros astros da música brasileira.
O primeiro conjunto, Os Tijucanos do Ritmo, foi criado em 1956 com o apoio da igreja dos capuchinhos, localizada na rua Haddock Lobo, também na Tijuca. No ano seguinte, com o amigo de infância Erasmo Carlos, para quem ensinou os primeiros acordes de violão, integrou os Snakes, que durou poucos meses.
No mesmo ano, com Roberto Carlos, Arlênio Livio, Edson Trindade e Wellington Oliveira, fez parte dos Sputniks, grupo que fazia cover de sucessos norte-americanos da época, sobretudo do rock, que acabava de surgir nos EUA. A banda chegou a se apresentar no programa Clube do Rock, comandado por Carlos Imperial na TV Tupi. Mas uma discussão calorosa entre Tim e Roberto Carlos, que almejava seguir carreira solo, pôs fim ao quinteto.
EUA
Em 1959, a Bossa Nova era a bola da vez no cenário musical brasileiro, mas para Tim, era coisa para a classe média da zona sul do Rio, muito distante da realidade dos jovens “tijucanos”. No mesmo ano, com a morte do pai, Tim Maia rumou aos 17 anos para os EUA, um sonho que alimentava havia alguns anos.
Em Nova York fez um pouco de tudo, trabalhou em lanchonetes, enfermarias e de faxineiro em asilo. Influenciado pela música negra, montou o grupo de soul The Ideals. Na ocasião ganhou o codinome “Jimmy, the Brazilian”. Tim Maia ficou no país até 1964, ano em que foi deportado para o Brasil após seis meses de prisão por porte de maconha.
O RETORNO
No Brasil, Tim começou a trabalhar como guia turístico no Rio. Mas a música ainda era o seu grande sonho.
Em 1966 gravou um disco com “Os Dominós”. No final de 1968, no programa Jovem Guarda, comandado pelo trio Roberto, Erasmo e Wanderléia, na TV Record, lançou um compacto com as músicas “Meu País” e “Sentimento”, pela CBS.
No ano seguinte, o músico foi convidado pela cantora Elis Regina para um dueto em “These are the songs”, composição de Tim que a cantora incluiu em seu álbum “Em Pleno Verão” (1970). A música já havia sido lançada pelo cantor em compacto. Ainda em 1969, o compositor teve o seu funk “Não vou ficar” gravado por Roberto Carlos, que tinha abandonado a Jovem Guarda um ano antes.
O INTRODUTOR DA SOUL MUSIC NO BRASIL
O primeiro LP de Tim Maia foi lançado em 1970, e trazia as primeiras pérolas do funk e do soul feitas no Brasil. Algumas, mescladas a vertentes regionais da música brasileira. Entre as canções de destaques do álbum estão “Primavera”, “Azul da Cor do Mar” e “Coroné Antônio Bento”.
Em 1971, Tim gravou as inesquecíveis “Não Quero Dinheiro (Só Quero Amar)”, “A Festa do Santo Reis”, “Não Vou Ficar” e “Você”. Depois vieram “Canário do Reino” e “O Que me Importa” (1972). Em Tim Maia (1973) o cantor trouxe “Réu Confesso” e “Gostava Tanto de Você”. Era a consagração de um astro.
TIM MAIA RACIONAL
Em 1974, Tim Maia entrou para a doutrina religiosa Universo em Desencanto, que o distanciou da boemia e das drogas. Nessa fase, produziu dois álbuns de sonoridades e arranjos considerados excepcionais pela crítica: Tim Maia Racional Volumes um e dois, lançados em 1974 e 1975.
Em 2000, algumas faixas descartadas desse período, culminaram no lançamento de um terceiro volume, este intitulado “Racional Volume Três”.
A relação com a seita, contudo, foi interrompida quando Tim foi informado que o mestre da doutrina, Manuel Jacintho Coelho, estaria comprando terrenos no Rio às suas custas.
Em 1976, fora da religiosidade e de volta às loucuras, Tim Maia entrava nas paradas com a música “Rodésia”. Mas o álbum que fechou a década em grande estilo foi Tim Maia Disco Club (1979), com as memoráveis e dançantes “Acenda o Farol” e “Sossego”.
UMA NOVA ERA
Em 1983, Tim Maia atuou apenas como intérprete no LP “O Descobridor dos Sete Mares”.É deste álbum a música “Me dê Motivo”, dos criadores de hits Michael Sullivan e Paulo Massadas, que compuseram ainda “Um Dia de Domingo”, um dueto de Tim com a cantora Gal Costa, muito executado nas rádios anos depois.
Com um estilo romântico e menos sofisticado, a década continuou com as populares “Bons Momentos” (1984), “Leva” (1985) e a contagiante “Do Leme ao Pontal/Tomo Guaraná, Suco de Cajú, Goiabada para Sobremesa” (1986) entre outras.
Em 1990, o cantor lançou “Tim Maia Interpreta Clássicos da Bossa Nova”. Cinco anos depois gravou “Arrastão”, “Corcovado” e “Aquarela do Brasil” no disco “Nova Era Glacial” (1995).
Em 1997, lançou os álbuns “What a Wonderful World”, onde revisitou músicas americanas que o influenciaram nos anos 1950 e 1960 e “Amigos do Rei”, em parceria com o grupo vocal Os Cariocas.
POLÊMICAS
Em 1977, atolado em dívidas, Tim Maia teve prisão decretada por vender um de seus carros que estavam penhorados pela Justiça. Em outra ocasião, em 1984, foi acusado de emitir um cheque sem fundos para o pagamento de uma passagem aérea. Nesta, foi processado por estelionato.
Em 1990, abandonou o palco num show realizado em Duque de Caxias, no Rio. O promotor do espetáculo entrou na Justiça contra o cantor.
Tim ficou conhecido também pelos “canos” em shows e atrações de TV. Em 1993, ao deixar de cumprir agenda no programa do Faustão, na Globo, o então diretor de programação da emissora, José Bonifácio de Oliveira Sobrinho, o Boni, emitiu um memorando vetando sua presença no canal. “Tendo em vista o comportamento reincidente do cantor Tim Maia, informamos que está proibida, até segunda ordem, a sua presença em qualquer programa da Rede Globo”, decidiu Boni.
O ÚLTIMO PROJETO
Uma semana antes de sair de cena, Tim Maia chamou o produtor musical Almir Chediak para retomar um projeto idealizado dois anos antes, em 1996, para o lançamento de um songbook com os maiores sucessos de sua carreira.
Contudo, assustado com os prognósticos de um vidente, disse ao produtor: “Almir, dá um tempo, porque esse negócio de songbook e biografia é para quem está com o pé na cova”.