Morto há 65 anos, Graciliano Ramos virou ‘escritor de vida eterna’
Durante os 60 anos de sua vida, o escritor alagoano Graciliano Ramos deixou uma série de livros publicados que marcaram a literatura brasileira, como “São Bernardo” (1934), “Angústia” (1936) e “Vidas Secas” (1938).
Vítima de câncer no pulmão, ele morreu no dia 20 de março de 1953, e seu amigo, o escritor paraibano José Lins do Rego, o apontou como sendo o maior romancista daquela época. “É um escritor de vida eterna”, afirmou.
Quando completou um ano da morte, o historiador Sergio Buarque de Holanda foi outro a fazer grandes elogios: “Um dos poucos cuja a obra se pode dizer desde já que se inscreve entre os clássicos da nossa literatura”.
1ª OBRA PUBLICADA
Os livros de Graciliano foram publicados nos últimos 20 anos de sua vida ou de forma póstuma. O primeiro foi “Caetés” (1933) e é considerado um romance de costumes modernos.
De acordo com o professor da USP Erwin Torralbo, “o problema, digamos assim, de ‘Caetés’ é ter irmãos de valor literário muito alto”.
“É preciso dizer que, a despeito de ‘São Bernardo’, ‘Angústia’ e ‘Vidas Secas’, o nome de Graciliano já estaria posto no debate da literatura brasileira por ‘Caetés’”, disse o professor.
Uma edição comemorativa desse livro, organizada por Torralbo e pela pesquisadora Elizabeth Ramos (neta do escritor), foi lançada em 2013.
PRISÃO
No mesmo ano em que lançou “Caetés”, Graciliano trabalhou como diretor de Instrução Pública de Alagoas, equivalente a ser secretário da Educação.
O cineasta Nelson Pereira dos Santos contou que naquela época os alunos cantavam os hinos de Alagoas, da bandeira e do Brasil todos os dias.
“A criançada cantava no sol, na chuva… Quando assumiu [o cargo], ele disse para cantar só o Hino Nacional e depois decidiu que era para cantar só a primeira parte”, declarou o cineasta.
O motivo era que Graciliano queria que aos garotos tivessem mais tempo para estudar. “Isso, além de outras histórias e boatos, fez que ele fosse considerado um subversivo”, continuou.
Durante “arrastão” promovido pelo governo Getúlio Vargas, Graciliano foi levado de Maceió ao Rio de janeiro e ficou preso entre março de 1936 e janeiro de 1937, sem processo e acusação formal.
Ele escreveu o livro “Memórias do Cárcere” sobre esse período de detenção, mas morreu antes de concluí-lo. A obra, sem o capítulo derradeiro, foi publicada em 1953 após a sua morte.
CINEMA
Fã do escritor, Nelson Pereira dos Santos levou “Vidas Secas” e “Memórias do Cárcere” para o cinema em 1963 e 1984, respectivamente. Porém, antes, quis filmar “São Bernardo”.
A ideia do cineasta era mudar o destino da personagem Madalena, que se mata no fim do romance. Só que o escritor não lhe deu autorização.
“Olha, se você quiser fazer o filme baseado no meu livro, tudo bem. Agora, se você quiser inventar uma história, faça a sua”, respondeu Graciliano em uma carta.
CARTAS E OUTROS TEXTOS
Além de “Memórias do Cárcere”, novos livros foram lançados, após a morte do escritor, a partir de crônicas, contos, correspondências, entrevistas, depoimentos e outros textos curiosos.
O livro “Viventes das Alagoas” (editado pela primeira vez em 1962), por exemplo, trouxe relatórios redigidos por Graciliano na época em que foi prefeito da pequena cidade de Palmeira dos Índios, em Alagoas. Ele assumiu o cargo em 1928 e renunciou em 1930.
Em um dos relatórios, usou seu talento com a língua portuguesa para se queixar de um antigo contrato da Prefeitura com a concessionária de energia.
“Apesar de ser o negócio referente à claridade, julgo que assinaram aquilo às escuras”, redigiu.
Já “Cartas de Amor a Heloísa”, de 1992, mostra um Graciliano diferente. A obra reúne mensagens, escritas entre 16 de janeiro e 8 de fevereiro de 1928, para Heloísa Medeiros, com quem se casaria.
“Confesso-te honestamente quem sou. Se não te agradam sentimentos tão excessivos, mata-me”, escreveu.
Em 2012, o livro “Garrancho” foi formado por uma coletânea de textos inéditos, escritos entre 1910 e 1950. São crônicas, críticas, discursos, um conto e o primeiro ato da peça “Ideias Novas” (1942) que nunca foi concluída.
Após 65 anos da morte do escritor alagoano, a declaração de José Lins do Rego de que Graciliano é um escritor de vida eterna permanece válida.