1993: Frank Zappa deixou rock and roll órfão de seu humor e inventividade

O mundo da música nesta terça-feira (4) completa 25 anos sem um de seus ícones: Frank Zappa.

Como bem escreveu o jornalista Fábio Massari em 1997, na Folha, com Frank Vincent Zappa é difícil ficar no meio de caminho. “É amar ou odiar. Ficar indiferente frente à música do ‘american composer’ requer sacrifício.”

Isso porque o americano nascido em 21 de dezembro de 1940, em Baltimore, foi um workaholic da música, tendo lançado mais de 60 álbuns ao longo de 30 anos de carreira e ter sido sempre imprevisível.

Em 1978, porém, num show em Paris, o guitarrista tocou durante três horas, inventando versões de suas “The Illinois Enema Bandit” e “The Torture Neves Stops”, aproveitando as brechas das músicas para fazer gozações com ingleses, para delírio dos franceses.

A efervescência surgiu na infância, quando vivia com o pai, a mãe e três irmãos mais novos. Agarrou-se à música e dela jamais se desprendeu. Foi baterista, compositor, vocalista e guitarrista, e não só isso.

A sua banda, Mothers of Invention, formada em 1964, como descrito em 1983 pelo jornalista Pepe Escobar na Folha, materializou o que Zappa construía em mente, que misturava música, paródias pop, referências clássicas (Edgard Varèse e Béla Bartók), improvisos de jazz de vanguarda, teatro de variedades e comédia burlesca.

Imagem de Frank Zappa que ilustra “You Are What You Is”, álbum duplo do cantor lançado em 1981 (Crédito: Divulgação)

Com um bigode e cavanhaque que também viraram símbolo, Zappa tinha um humor impagável. Exemplo disso: com a banda usando máscaras de gases, de repente todos os músicos ignoravam o público e cessavam a música, e o baterista se levantava para engraxar os sapatos de Zappa. No limite da paciência do espectadores, ele ironizava: “Isto traz à tona todas as hostilidades dentro de vocês, não é?”.

E poucos souberam brincar como Zappa, que reunia desde ácidas críticas ao establishment, deboche e improvisos únicos com a guitarra que o colocam ao lado de Jimi Hendrix, Jeff Beck e Eric Clapton. Um exemplo do que falava: “Não usem drogas, crianças! Elas arrasam o fígado, o coração, a cabeça e, de modo geral, fazem com que vocês fiquem que nem os seus pais”.

Não à toa e por ter deixado uma das mais inacreditáveis discografias, Zappa teve seu nome incluído no Hall da Fama do rock and roll, em 1995, (“Repórteres de rock são pessoas que não sabem escrever, entrevistando gente que não sabe falar para leitores que não sabem ler”, dizia) e também deixou um enorme legado no jazz. Ganhou ainda Grammy póstumo pelo conjunto da obra, em 1997.

Para dar uma ideia de como a obra de Zappa influenciou a música, nada menos do Paul McCartney disse que, se não fosse “Freak Out” (1966), não haveria “Sgt. Pepper” (1967), dos Beatles.

O americano, que também chamou a atenção por participações políticas —chegou “a se lançar” a Presidência dos EUA— e virou tema de filme, morreu em 1993, aos 52 anos, vítima de câncer na próstata.

Abaixo você confere um texto do músico, escrito e publicado pela Folha em 3 de abril de 1983.

Americanos e mediocridade
“A América deveria se orgulhar das coisas que foram produzidas aqui e são excepcionais, diferentes, ousadas, e não coisas das coisas que se fingem de excepcionais, diferentes e ousadas. A América deveria optar pelo que realmente conta. Mas os americanos não optam, porque nunca são expostos a isso. O trabalho transgressivo nunca chega ao rádio, e nunca é comentado. Porque tudo que é ouvido sobre a dita vida musical nos EUA é de autoria de pessoas em jornais e revistas que não estão qualificadas para a tarefa; não são capazes de diferenciar uma composição boa de uma péssima, e não sabem diferenciar uma ótima composição mal tocada de uma composição medíocre que ganhou um grande tratamento molto vibrato por uma orquestra importante (…) É o clima dos tempos. Você faz alguma coisa realmente ousada, e fica com sua vida na palma da mão. Todo mundo quer ficar com a mediocridade.”
Frank Zappa